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domingo, 17 de fevereiro de 2008

CRÍTICA DO ÓBVIO



MGTV (Jornal global do estado de Minas Gerais), 11 de Janeiro de 2008, 12:38h.
NOTÍCIA: “Nas férias escolares, aumenta o índice de acidentes de crianças dentro de casa


Nas férias escolares, aumenta o índice de acidentes de crianças dentro de casa”? Não pode ser!

Quando eu era criança, muito da estúpida por sinal, quebrei as duas pernas e os dois braços – um membro de cada vez, meu povo. Provavelmente, porque estava de férias.

Também o “capitão do mato” e “branco mais preto do Brasil” Vinícius de Moraes eternizou a peraltice infantil em um belo poema, não aquele do Mr. Buster e nem aquele da estrelinha polar, mas um que se chama “Poema Enjoadinho”. Dizia na parte final:

Filhos são o demo
Melhor não tê-los...
Mas se não os temos
Como sabê-los?
(...)
Chupam gilete
Bebem xampu
Ateiam fogo
No quarteirão
Porém, que coisa
Que coisa louca
Que coisa linda
Que os filhos são!

Constatações. Se crianças são naturalmente displicentes e permanecem na escola para alguém tentar dar jeito nesta displicência, não seria natural que nas férias escolares, elas que permanecem mais tempo dentro de casa, se acidentariam mais dentro de casa?

Não se surpreenda se no dia de retorno às aulas, este mesmo âncora jornalístico, que estudou quatro anos de jornalismo e, provavelmente, mais um ou dois de pós-graduação, anunciar as notícias deste modo: “Uma velhinha é assaltada e morta a tiros perto da área hospitalar”, “Saiba como prevenir multas de trânsito” e finalmente, “Após o retorno das aulas, aumenta o índice de acidentes de crianças na escola”.

Já a respeito das notícias do dia do Natal, este mesmo senhor, chegaria ao telespectador deste modo: “Aumenta o índice de enfeites de Natal nas casas dos belo-horizontinos” ou “aumenta o índice de consumo de panetone nesta época do ano”. Das notícias de óbito, poderia dizer, por exemplo, que “Morreu ontem em Lagoa Santa o célebre advogado X, que fez direito e cursou advocacia”.

Eu pergunto então ao leitor, talvez um pouco mais espertinho que o âncora mencionado (é claro que ele é o primeiro do jornal na escala de esperteza, já que os seus superiores correspondem aos últimos degraus): faltam notícias ao telespectador? Ou notícias óbvias e desinteressantes devem existir para minimizar o sangue que jorra?

Não haveria outro teor para este tipo de notícias? Nem sei das respostas. Mas, de agora em diante tomarei conta dos meus filhos com mais cuidado, já que “Nas férias escolares, aumenta o índice de acidentes de crianças dentro de casa”. Nunca se sabe, não é mesmo?


Engasgando com o almoço, 11/01/2008.


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